sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Os Sem Mandamentos

Já posso começar? Separe lápis e papel, e preste atenção, a lista é grande.
Não tome sol entre dez e quatro da tarde. Use protetor solar. Beba dois litros de água por dia. Faça exercícios pelo menos três vezes por semana. Evite frituras e refrigerantes. Coma verduras e legumes diariamente. Não coma carboidratos a noite e nem exagere muito no sal. Faça check up regularmente, sobretudo se tiver mais de quarenta anos. Não fume, claro que não. Não coma gordura trans, seja lá o que isso quer dizer. Açúcar, moderadamente. (Isso é possível?). Não gaste mais do que ganhe (alguma mulher no recinto?). Pague o total do cartão de crédito ou renegocie a dívida. Escute mais do que fale. Não dê opinião na vida alheia, a menos que seja pedido. Amamente seu filho até seis meses, exclusivamente no peito (e vire-se caso tenha que trabalhar antes disso!). Faça uma boa ação de vez em quando, claro. Respeite os mais velhos. Use camisinha.Tenha um plano de previdência privada e uma poupança no valor de seis meses do seu salário. Aprenda a falar fluentemente um idioma. Não cobice o que não lhe pertence. Coma de três em três horas. Escove os dentes depois refeições, e passe fio dental também. Não desperdice água nem energia. Use produtos ecologicamente corretos e seja um consumidor consciente. Além dos óbvios conselhos bíblicos: mão mate, não cometa adultério, não roube e blá, blá, blá.
Anotou direitinho? Agora, o melhor conselho de todos: divirta-se! É que a regra de ouro nesta vida é a seguinte: somos todos responsáveis pelos nossos atos. Então, tire metade da bobagem que escutamos desde que nascemos e que não fazemos e que até hoje, amigo, não matou ninguém e vá fundo que eu vou junto!

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Gente Grande

Acordei com uma presença ilustre em minha vida. Sei que esteve presente ao meu lado durante os últimos 34 anos. Dias bons, outros ruins, em nenhum deles me abandonou. Vez ou outra acordava eriçado, em outros, comportado, me enchendo de orgulho. Mas no meio de tantos outros, passava despercebido. Hoje, especialmente hoje, se destacou no meio da multidão. Um fio, minúsculo e tímido, quase escondido entre os demais, mas eu o vi, e ele estava lá, me encarando pálido, coitado, assustado. Era um fio de cabelo branco! “Só isso?” Você pergunta. “Ora, era de se esperar, no meio dos trinta, filha na escola, dez anos de formada.” Eu sei, eu sei, mas tomei um choque, um susto danado, reconheço. Chegaste tão cedo, nem me preparei direito para este dia. Ai meu Deus, já?
Se não foi outro dia que estava no colegial, estudando madrugadas a dentro para passar na faculdade de direito. Outro dia que conheci meu marido numa quinta-feira, festa do dia dos namorados numa boate da moda que já não existe mais há dez anos! Boate? Ui! Há dez anos?Aff! Envelheci mesmo... “Lembro como se fosse hoje”, “quando eu era criança”, “na minha época”- festival de expressões vintage que já andam sapateando nos meus lábios recentemente. É, o diagnóstico se confirma: sou gente grande, sem sombra de dúvidas.
Ainda estou nova, bem sei, hoje podemos viver bem e com saúde até noventa anos ou mais. Mas a sensação de que se já cresceu, que o tempo não volta mais, e que uma parte da sua vida faz parte da sua memória é algo perturbador, e que nos faz refletir sobre aonde se quer chegar. E ainda falta um bocado de caminho, que alívio! Meus planos vão se renovando, mas a vontade de fazer as coisas acontecerem continua a mesma. Ainda me reconheço, sou a mesma menina devoradora de livros e de sorvetes, que adora dançar, que escreve e fala compulsivamente. Sou eu, eu mesma, aquela da foto, à direita da professora, mas, graças, sem aquele cabelo pavoroso de vinte anos atrás. O meu sorriso continua o mesmo, pode conferir. Um pouco mais amarelado, com umas ruguinhas ao redor da boca, mas igualzinho.
Ao invés de olhar para trás, olho para baixo e me vejo ali, naquela criaturinha faladeira, agitada e comilona de dois anos de idade, meu pedacinho de mim, a continuação da estória que não para por aqui. Então o fio branco, solitário, desaparece, e se torna apenas um registro burocrático do tempo, totalmente inofensivo. Hei, Paul, ainda faltam 30 anos para eu fazer 64, para eu perder os fios que hoje só mudaram de cor. Somos jovens, e ainda temos todo o tempo do mundo, afinal.

 

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Sem Receita

Às vezes precisamos decodificar e adaptar as mensagens que recebemos por todos os lados ao invés de simplesmente introjetá-las. Moderação é que nem Bombril: serve para tudo nesta vida. Já basta engolir esses outdoors de autoajuda que a mídia vomita nos telespectadores nesta época do ano, vamos pensar, cada um, com sua própria cabeça, afinal, é para isso que Deus deu uma a cada um e não uma coletiva, de uso comum.
Sou uma dessas pessoas que sempre ouviu e cumpriu a máxima de “correr atrás do que se quer”. Empenho sempre foi meu sobrenome. No entanto, algumas vezes as coisas aconteciam, e outras tantas, não. Ficava intrigada com as pessoas que nada faziam e eram agraciadas com surpresas inesperadas. Meu espanto era tamanho que foi alvo de sessões seguidas de terapia. Sentia-me abandonada pela sorte, logo eu que tanto fiz para merecê-la!
Pensando sobre o assunto, consegui perceber uma linha comum de comportamento nesses sortudos invejados: eles não carregavam o peso da ansiedade, faziam a sua parte e, pasmem, sabiam esperar. E esperar não o relógio, mas o tempo das coisas, que é diferente do tempo do mundo, empacotadinho em horas, dias, anos. Enquanto o dia esperado não vinha, viviam suas vidinhas sem que o desejo se tornasse obsessão. Simples assim, como uma manhã de domingo. A diferença entre nós, o público fiel dos ansiolíticos, e eles, os que vinham de fábrica com uma produção interna de corta-ansiedade, era que eles não deixavam a vida em suspenso enquanto seus anseios não viravam realidade. Não diziam para si mesmos: “quando eu mudar de casa, faço isso”, ou “quando encontrar um  marido, faço aquilo”. Eles se viravam com o que tinham, e viviam felizes sabendo que um dia algo viria para modificar suas vidas. Não ficavam desenhando palitinhos na parede esperando o dia que seriam livres, já eram livres enquanto esperavam por este dia. Livres deste grande mal: a ansiedade.
Mas, vem cá, como é possível viver enquanto se espera? Eu diria que, apesar dos nossos maiores esforços, não somos nós que mandamos em nossas vidas. Contribuímos muito para o que virá, mas não há nada que possamos fazer que nos assegure o que iremos receber e quando. Esse é um dos maiores medos que temos que enfrentar, afinal, o de que nem tudo pode dar certo em que pese nosso sangue, suor e lágrimas. Não sei se essa constatação vai me trazer mais ou menos serenidade, ou se, de alguma forma, vai esvaziar meu ânimo para voltar à luta. Quem sabe me ajude a sintonizar a dosimetria certa de empenho e de esforço a verter em meus projetos, no que sempre exagerei na conta sem ver muito resultado. Ou, e prefiro este final para a história, que seja o início de uma revelação que me foi dada pela metade. Não sei. Só sei que devo me preocupar menos, e aprender a deixar um pouco mais frouxa esta rédea na qual eu seguro a minha vida. E sair galopando sem destino por aí vez ou outra.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

On the Rocks

Tenho ressaca da vida de vez em quando, sabe ressaca, gosto amargo na boca, vontade de colocar tudo para fora, ânsia, cansaço, vontade de nada.
Normalmente é efeito colateral dos excessos que cometemos diariamente: excesso de gente, de energia, de trabalho, de palavras. E então eu me recolho, quieta e contemplativa, esperando que tudo volte ao normal, que o rio deságüe no mar, que o cravo reencontre a rosa, que o mundo volte a girar. Talvez seja esta nossa inesgotável capacidade humana de acreditar, talvez seja, apenas, o final de um ciclo, ou a vontade soberana do criador. Mas este dia sempre acaba chegando, e eu me animo: mais um pilequinho, nova ressaca, e no final tudo volta ao normal novamente.
Mas sabe, ando mais seletiva, ultimamente. E esses porres de vida andam sendo mais esporádicos, embora mais prolongados. A resistência do organismo vai endurecendo, e mais e mais vezes ele reclama. Preciso obedecê-lo, dispensar quem me deixa enauseada, quem fala sem dizer nada, quem cansa meus ouvidos e me faz revirar os olhos, quem me dá uma surra de futilidade. Com esses, chega, não divido mais a mesa e não brindo mais nem com champagne.  Desta gente, juro, e ajoelho depois, não beberei jamais.
Quero novas fontes de vida, eu vou é procurar companhia em outros bares, com quem saiba dividir mais do que papo de bêbado, e que me acompanhe por outros caminhos. Com ou sem álcool, sem ou com gelo, mas que tenha coragem e seja autêntico.
Tenho ressaca é de gente falsificada.
 

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Múltipla Escolha

Lá fora chove gatos e cachorros. Há amargura, e dor. Há quem queira desistir, quem não suporte mais esperar. Há quem deixou seu sonho para trás, quem se decepcionou, e há, também, quem não se dá por vencido, quem morre tentando. Há espaço para todos, há mundo para tudo. Basta escolher. E seguir em frente.
Posso ser a executiva super estressada, que coloca metas até para seu bebê de poucos meses: ele terá que andar com menos de um ano! Ela precisa de um filho bem sucedido para prolongar seus genes de sucesso.
Posso ser a sonhadora, romântica, aquela sem grana, que é cheia de ideais, que adora uma saia comprida florida, e pratica ioga três vezes por semana. Ou a intelectual ansiosa pelo próximo título acadêmico, que, orgulhosa de seu feito, conta entre um chope e outro que leu a obra de  Proust toda no original.
Quem sabe ser a mulher prática, sem frescura, que viaja o mundo todo, e vive morando num lugar diferente. Ou a hipocondríaca ansiosa, que vive mudando de médico, e se autoreceitando pílulas de sobrevivência.
Podemos escolher uma filipeta de papel aleatório, de olhos fechados, sorteando quem seremos, ou tomarmos uma decisão sensata, equilibrada, consultando a nós mesmos. Mas podemos ser qualquer coisa. E mudarmos de novo, se assim escolhermos. E de novo, e de novo. E isso não é incrível? Como ainda não despertamos para a maravilha do livre arbítrio? Lembro-me de ouvir, nas aulas de religião de outrora, que Deus nos deixava escolher, e foi assim que conheci essas duas palavrinhas: livre e arbítrio. E meu mundo mudou.  
 

Vida: Modo de Usar

As vezes dá vontade de parar de pensar. Parar de rodar esta máquina, trocar o óleo, deixá-la contemplativa, em manutenção.
Expurgar as infinitas possibilidades de ação, a dúvida de cada passo dado. Eliminar o “e se” do vocabulário. A tortura mental pelo arrependimento hipotético, daquilo que podia ser e não foi. Livrar-se das amarras deste exercício diário, trocá-lo por uma caminhada matinal, por power ioga, que seja meia hora de pique-pega com o filho já tá valendo.
Não deixar espaço para a cobrança pessoal, para o medo de errar é um desafio e tanto, obra de uma vida inteira.  E sempre haverá a dúvida daninha que insiste em brotar mesmo que sejamos vigilantes. Mas para que tanto drama? O caminho que escolhemos normalmente tem retorno, há chance de rever nossas decisões em quase todos os casos. Bem se vê que, no fundo, o medo é outro, é o de reconhecer que erramos e virar, a esquerda ou a direita, ao invés de seguir em frente.
Do que você tem medo, afinal? De reconhecer seus erros, de ter que explicar-se aos outros, do julgamento alheio? Ei, somos humanos, e faz parte deste script passar por essas fases, é o meio pelo qual se chega a algum lugar, se é que se quer sair do lugar. E nem pense em pular de fase, queimar etapas, tentar um atalho. No final das contas, a vida sempre alcança quem foge dela.
O veneno do julgamento alheio é algo contra o qual nem vale a pena lutar, desperdício de tempo e energia, quase um movimento sem sentido. Se radiografássemos o que está por trás de muitas dessas palavras ficaríamos surpresos com a quantidade de inveja, de ciúmes e de fraqueza que se disfarçam sob a máscara do “bom conselho”. Se precisar de alguma ajuda, procure quem realmente gosta e se importa com você. Para todos os outros, que falem sozinhos, e mordam a língua.        

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Conselho Mineiro

Você certamente conhece alguém assim. Que está sempre de autos no pique-pega da vida, sempre em suspenso, se encostar a pessoa reclama. E reclama também se questionar, se duvidar. Ai de quem queira tirá-la de lá, do seu berço esplêndido, de onde não pode ser tocada, nem contrariada.
Não saber ouvir críticas, e devolve opiniões contrárias como se fossem um presente de grego. Rejeita tudo aquilo que não for dela própria: sua verdade, seu mundo. E um “sai para lá” para quem estiver de fora. Se me ama mesmo, assine aqui, assine embaixo de tudo que faço, ok?
Ai, como é muito difícil amar alguém assim! Porque nada daquilo que fazemos passa pelo seu controle de qualidade. E como há de passar? Se só ela é que saber fazer, se ela é que inventou como se pode amar.
Pessoas assim colecionam códigos: há leis para tudo. E penas para quem descumpri-las: dormir só se for de luz apagada, beijar só se não for em público, diversão, só no final de semana, e felicidade só com hora marcada, por favor. E ai dela se chegar atrasada!
Os agradadores compulsivos do lado de cá, carentes como um cachorro que caiu da mudança, vivem sofrendo e morrem tentando. Não desistem de agradar a ditacuja. Como lidar? E me responde minha tia mineira, com nome de santa e com palavras de fada.
Deixe para lá, ô, menina, salve seu coração enquanto é tempo, uai! Pra gente que não sabe ouvi, para que há de perdê seu tempo a falar? Fica aí escrivinhando, num muxoxo, pelejando para saber porque que faz tudo errado, num agrada com nada, mas, olha, tem gente que nasceu para apoquentar mesmo, fica assim, não, bem. É que tem gente que não sabe dizer o que sente e aí desanda a machucar quem precisa ouvir carinho!”
As vezes falta palavra, mesmo, tia. E sobra sentimento.Obrigada pelo conselho e pelo pão de queijo.  

terça-feira, 11 de setembro de 2012

TOP Zero

Ando intrigada com a quantidade de gente preocupada em agrupar em listas, ou, na assustadora versão neologista, ranquear, tudo que vê pela frente como se o mundo fosse uma versão Top 10 de bolso. Os melhores restaurantes, os melhores vinhos, os melhores destinos para se viajar com crianças, com amigos, com o marido, sozinha, 100 livros para ler, 100 discos para ouvir, 1000 lugares para se conhecer antes de morrer. Ufa! Foi dada a largada, vamos correr atrás do prejuízo, não podemos deixar esta vida terrena sem experimentar todas as dicas desses guias de autoajuda. E não é só você que pensa assim, amigo, e aí, bem, aí é que mora o problema.
Confesso que a lista dos 1000 destinos é, para uma viciada em viagens como eu, deveras tentador, mas de repente transformou-se, de um convite à diversão a um convite à depressão. Primeiro porque, salvo melhor juízo, como diriam meus colegas de profissão, é humanamente impossível alguém conseguir dinheiro e férias disponíveis para conhecer tantos lugares, muitos deles no mesmo país. Talvez a única que tenha conseguido a façanha tenha sido justamente a jornalista que o escreveu. Garota sortuda, ela.
Segundo porque essas listas horripilantes provocam um efeito ainda mais assustador que a palavra ranquear: o visitante de massa. Sabem quem ele é? É aquele que anda em grupos, viaja em excursão, adora tirar fotos e falar alto, e gosta bem pouco de viajar. E não vou ser católica uma hora dessas, para o espaço com o amor ao próximo: não, eu não simpatizo nem um pouco com este incômodo vizinho.
Olhe a sua frente, ao seu lado, tem sempre alguém como ele na sua dianteira, correndo afobado por mais um título. De todos eles, o contador de histórias é o meu maior inimigo. Ele sempre se valoriza demais, e recheia suas histórias com pitadas de mau gosto, preconceito, e mentirinhas. Fala sério, ele se acha o cara, o engraçado, o que passou pelas maiores aventuras, o que conheceu os 1000 lugares do livro da jornalista americana e a própria jornalista americana, que, aliás, cruzou com ele e bebeu um drink em um encontro acidental em Acapulco. E saiu caidinha por ele, naturalmente. Peraí, deixa eu vomitar um pouquinho, já volto.
Aff! Já passei da idade de me preocupar em valorizar essas disputas ou o barulho que se faz em torno delas. Silêncio para mim é categoria cinco estrelas na minha lista vip e pouca gente também. Prefiro lugares e pessoas especiais e selecionadas, pessoas com “denominação de origem controlada”, de safras antigas, e bem cultivadas, que sabem valorizar o que é realmente importante. Pessoas orgânicas, sabe, sem esses agrotóxicos “de massa”.
O que dispenso e realmente não preciso é deste agigantado adjetivo que acompanha tudo que se faz ultimamente: turismo de massa, justiça de massa, comércio de massa, como se fossemos uma manada de bois que anda sempre em bando e faz tudo igual. Alguns são, realmente, como o turista sabichão. Mas comigo não, violão.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Papo Sério

Dispense o smartphone por alguns minutos e preste atenção. O papo é sério. Precisamos repensar a educação que estamos dando para os nossos filhos. Ninguém saber ouvir um “não”. As críticas são rejeitadas enfaticamente, como se fossem um comentário maldoso e destrutivo, feitas por invejosos, por quem que não gosta de você. A geração que está crescendo perante nossos olhos é a do “comigo ninguém pode!.” Não se pode confrontá-los, repreendê-los, questioná-los. Não foram preparados para lidar com adjetivos negativos sem que ouvi-los seja quase como receber um soco no estômago ou um tapa na cara. Ou ambas as coisas. Reações exageradas de crianças grandes e mimadas. Sentem-se acuados, num misto de insegurança e susto, como se errar ou fracassar fosse ato criminoso e vexatório. Certamente você também conhece alguém assim.
Em perspectiva macro, esses projetos mal acabados de adultos, ao se depararem com uma frustração, viram assassinos em série vingando-se do mundo que não os tratam que nem papai e mamãe. Tiroteio no cinema, tiroteio no colégio. Quer algo mais brutal e infantil ao mesmo tempo? E lá se vai a conta para o “bullying”, para os transtornos de personalidade e para mais uma meia dúzia de explicações psíquicas. As desculpas se proliferam, e desligamos a televisão, chocados e calados. Se a psiquiatria sempre encontra uma resposta, o que se pode dizer? Que o mundo está doente, e as pessoas também, diria minha avó.
A frustração e as derrotas fazem parte da construção pessoal do ser humano e servem quase como um ritual de passagem para o mundo dos adultos. Precisamos ouvir muitos “nãos” até mesmo para sabermos valorizar um “sim” quando ele chegar. Ah, porque tem isso também, o excesso de “sim” provoca uma felicidade anestesiada, blasé, sem sal. E vejo muito isso ao meu redor: adolescentes premiados a todo instante como se a vida fosse uma sucessão de conquistas e medalhas. Quando caem na realidade e não sobem ao pódio como estão acostumados, diagnosticam-se como deprimidos e passam a viver a base de antisiolítico e terapia intensiva. E nunca ficam curados, já reparou?
Vamos crescer, virar gente grande, parar de fazer beicinho e bater o pé, minha gente! Antes que seja tarde demais para isso.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

A Beira do Caminho

Lá fora faz sol, mas hoje é dia cinzento dentro de mim. Um dia de alma cansada, que reclama um ar puro, longe destes espigões envidraçados e dessa colméia de gente que passa entre eles. Mas estou presa, não posso ir. E a cada segundo me sinto mais asfixiada pela poluição da rotina, da responsabilidade, do dever a cumprir. E quero fugir. Mas não posso, não devo, não vou.
Sem remédio, sou consumida por este mal, mas ainda me resta a resignação e os atalhos, estreitos e inabitados, que tento resgatar dentro de mim. Voz feminina cantando Vinicius, cheiro de lavanda, sabor de chocolate com canela. Chego mais perto, quase lá. Agarro-me a eles e me afasto do mundo. Aqui, em algum lugar por dentro, onde ainda há um pouco de paz, de silêncio, de alma, de mim.
Hoje é esse meu endereço no mundo, o meu refúgio e o meu consolo, e o que me mantém de pé mesmo asfixiando, sufocando, precisando, desesperadamente, de ar.
Sobrevivo ao dia de hoje e sigo tentando encontrar este lugar todos os dias. Em meio ao caos, ao medo, ao que se espera de mim. Penso em desistir, mas algo ainda mais forte me traz de volta a estrada. É preciso seguir, sussurra uma voz em meu ouvido. Obedeço, volto para o caminho, mas, qual é a direção a seguir? Diga-me, para onde que eu vou?

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Cena de Cinema


Outro dia fui ao cinema, mas nem lembro mais do filme. Fui tomada de assalto por uma cena que aconteceu na platéia.
Um casal já sentado, por descuido, mau jeito, ou seja lá por qual motivo for, ao se ajeitar na poltrona atingiu, com um chute, a poltrona da frente, em que estava sentada uma mulher acompanhada do marido. Isso já aconteceu comigo algumas vezes, e, normalmente, em dias felizes, finjo nem me incomodar, e em outros, mais raivosos, faço um comentário entredentes reclamando da má educação do meu vizinho.
É fato, e consumado, que todos estamos sujeitos a isso num mundo em que convivem bilhões de pessoas, e no qual várias delas dividem o mesmo espaço ao mesmo tempo. O meu desafio particular atual, inclusive, é saber levar estes incidentes na esportiva.
Pois bem. Neste caso, como costumeiramente tenho visto acontecer, o casal da frente- as vítimas do chute- não levaram no fair play. O marido se virou para o descuidado “agressor” e lá se foram impropérios de A a Z, e o que é pior, em alto e bom som para o cinema inteiro ouvir. Algo como “vamos resolver isso lá fora” foi dito por algum deles. Tomei um susto. Eu e todos que lá estavam, e começamos a assistir a deplorável cena: um bate boca sem fim, que levou o casal que provocou o mal estar a levantar-se da cadeira e ir se embora ainda no meio da balburdia. E o cidadão ainda saiu vociferando que o outro, pela sua intolerância, teria estragado o programa dele. Climão total. Mas a cena não terminou aí não. Mal tinha começado o trailer, e o senhor voltou, sozinho, subindo as escadas até a fileira do outro. Silêncio. Princípio de pânico para quem se lembrou, como eu, dos últimos episódios trágicos que tiveram o cinema como palco. Uma pessoa manda um “deixa para lá, cara, vá embora”. E ele, magistralmente se vira para todos e diz: “não vim aqui brigar, fiquem tranqüilos. Vim fazer o que deveria ter feito logo no inicio: pedir desculpas. Já perdi minha noite mesmo, mas acho importante dizer isso em público. Teria evitado todo este constrangimento. E peço desculpas a todos vocês pela confusão involuntária.” Virou-se e foi embora aplaudido. Corrijo-me: ovacionado que nem cantor famoso depois do bis. E ainda me sai com essa:  “ E depois ainda dizem que tricolor é mal educado! Eu sou tricolor, gente! ”
Pronto. Com seu pequeno gesto ganhou até a simpatia dos adversários, em especial da flamenguista que vos fala! Clap, clap, clap!

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Rotina


E todos os dias começam do mesmo jeito: a vida é repetição: de dias, de desejos, de medos, de loucuras.
Acordamos ora cansados ora felizes, e seguimos o roteiro das tarefas diárias, as vezes com perfeição cirúrgica, outras com desânimo total, na maioria das vezes com um misto de ambas. 
Passamos todos os dias pelos mesmos caminhos, no itinerário de repetições infinitas que nos leva ao trabalho, à escola, e de volta para casa. Cumprimentamos quem não conhecemos, e fingimos não ver quem nos conhece. Beijamos os filhos e partirmos, sempre com o coração apertado. Tentamos nos divertir no meio da selva da rotina fugindo para onde houver algum espaço, as vezes com tanta distração que nos esquecemos de voltar.
Insistimos naquilo que sabemos que não vai dar certo, por teimosia ou amor a luta, e rezamos todas as noites por dias novos, que nunca inventamos. Se somos surpreendidos com a visita do inesperado, agora rezamos, todas as noites, pela volta à rotina.
Quando o final do dia chega, vontade de tudo e de nada nos apondera. Vontade de estréias, mas a televisão nos hipnotiza. Dormimos com a esperança e acordamos conformados e assim a vida se esvai, dia após dia.
A rotina é prisão, mas também boa companhia. É aquela presença incômoda, e, ao mesmo tempo, reconfortante. É a serenidade do que nos é conhecido, outras vezes o tédio que nos oprime e sufoca .
Rotina tem cheiro de café com leite e aquele gosto de comida caseira. É o sofá velho da sala, e o capítulo do dia da novela das oito. É colo, é lar, é afago, dos quais temos que tirar férias algumas vezes por ano. Sem medo, e sem enganos.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Os Supersensíveis

Essa onda do politicamente incorreto está extirpando nosso senso crítico, que é, afinal, o que o ser humano tem de melhor. A opinião pública E privada está massificada, e ando enjoada de ouvir mais do mesmo. Quero que me surpreendam, que mandem as favas as convenções sociais, que tenhamos coragem em dizer o que anda aprisionado em nós! Um habeas corpus ao besteirol saudável de cada dia! Ponho me a começar.
Quem foi que disse que mulher grávida é linda? Parem com isso. Não há nada angelical em engordar quinze quilos em poucos meses, em ser lobotomizada pelos seus hormônios mais vis, em ficar inchada e não explodir, em ter desejos esdrúxulos e aversão a quem te ama. Em aumentar suas ânsias de vomito e sua produção de xixi em produção geométrica.
E essa onda de ser feliz para o mundo (e infeliz para si mesmo)? Quem inventou? De ter que sorrir histericamente, de ser simpático com quem é falso, de dizer sim quando se quer dizer não...de dançar essa música social mesmo quando se quer ficar sentado no fundo no salão comendo salgadinho e bebendo cerveja. Ninguém alivia, ninguém te permite ficar lá, feliz do seu jeito...
A falsidade combinada de dizer o que a pessoa quer ouvir, e não aquilo que realmente perguntou. E aquele sorriso amarelo que nos denuncia, mas que fingimos não ver. A quem ele engana?
Um gole de “cuidado” tem que ser ingerido religiosamente todas as manhãs para não causar estragos aos ouvidos de cristal e às peles finas que andam se multiplicando por aí. “Cuidado com o que fala”, ou sua versão “pisar em ovos” devem ser calçados todos os dias, como sapatos. Ou, se for descalço, prepare os ouvidos.
As pessoas andam se ofendendo com qualquer coisa, um olhar atravessado, um solavanco sem querer e pronto: lá se ouvem palavrões dos indivíduos intocáveis, dos supersensíveis. Ninguém sabe aceitar uma crítica ou ser atingido por qualquer faísca. Nós e os nossos superegos, superalimentados com Coca-cola, Nescau e Danoninho que nos acalentaram na infância, nos mimaram na adolescência e nos fizeram super heróis: os super frágeis . Nada super.
Quer saber? Hoje eu acordei e coloquei meu ego na geladeira. Vamos ver no que que dá.




quarta-feira, 18 de julho de 2012

Dos medos e outros demônios

A dúvida nunca foi boa conselheira, mas temos que aprender a viver com ela. A danada é presença confirmada no mundo de hoje, de amanhã e do futuro, e vive nos testando e perguntando, a todo momento, se temos certeza. E temos? Haja autoconfiança!
Antes de cada decisão, múltiplas escolhas. A vida virou uma sucessão de questões em que se deve assinalar com um “x”, em que há uma fartura de variedades para tudo.
Ir ao supermercado fazer uma compra simples virou tarefa das mais complexas, um sem número de marcas ou uma diversidade de categorias confundem um consumidor menos atento. Só de açúcar, descobri recentemente que existe o mascavo, o light, o diet (?), o Premium, o em pedaços, o confeiteiro e por aí vai...
A certeza, quando ou se alcançada, fica sambando na corda bamba, bombardeada pelas nossas dúvidas. “Será que fiz a coisa certa?” “E se tivesse sido diferente?”
Com receio dos tombos que possam vir, o ser humano se enrola em sua casca e cada vez menos coloca a cabeça para fora. Tem medo de tudo, e carrega sua inseguranca para onde quer que va . “Não fui eu” é o novo meme corporativo.  Ninguém assume os riscos, a culpa, os erros. Há sempre uma resposta pronta na ponta da lingua, e continua-se rodando sem sair do lugar, num carrossel imaginário.
O medo de assumir suas escolhas e o possível insucesso delas criou uma espécie humana infeliz e eternamente insatisfeita: os “agradadores” compulsivos. Agrada-se a todos, menos a si mesmo. Equilibrista de egos, essa espécie tenta, sem conseguir, atingir o ponto ótimo de satisfação de todos, mas esquece de si mesmo. Não fala nem faz o que quer nem o que pensa, e passa seus dias buscando antiácido que lhe alivie os sapos engolidos inteiros. Missão impossível a dele, mas ele teme se revoltar e ser ele mesmo. Imagine o risco que corre em ser autêntico! Ninguém lhe ensinou a fracassar. Pobre alma!
Sigamos nos enganando, terceirizando responsabilidades, fingindo que estamos aprendendo algo com isso. Mas é perda de tempo, sabemos todos. Há que se deixar a área vip do nosso ego, essa zona de conforto que não nos permite ousar, mudar, errar. E começar de novo, se for preciso. É para isso que estamos aqui, minha gente. Façam valer a pena!  

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Do que eu não entendo

Foge a minha compreensão: café descafeínado, cerveja sem álcool, chocolate diet. Se não gosta de cafeína, tente adrenalina, desista do café. Não gosta de pilequinho? Nada de cerveja, refrigerante para você. E essas invencionices de casamento aberto, de ginástica passiva, de crédito sem dinheiro? Não entendo! Não quer engordar? Faça jejum, corra a meia maratona, nade até doer os braços, mas não me venha com mentiras dietéticas para enganar seu ego ou essa de ficar deitada para alguém suar por você. Não gosta de se prender? Então viva de forma livre, e leve junto as conseqüências, matrimônio não serve para o seu número, desista das alianças! Vive fugindo dos cobradores? Muito simples: pare de se endividar!
Mas você não ouve, não quer saber, prefere enfiar o capuz da ilusão, daquilo que você gostaria de ser, mas não tem coragem de tentar. Não sei quem lhe ensinou a ser assim, a vida não lhe trata deste jeito, ela não tem meio termo, meias palavras, meias verdades.  E quando ela resolve lhe dar uma rasteira, você aciona o comando da autopiedade. E deprime.
Não entendo quem quer vida pronta, pré-embalada a vácuo, e sem desperdício. Quem procura um grande amor sem se arriscar, ou quer viver sem se arrepender. Quem não quer tentar, ou vive acomodado com medo de errar. Tem jeito não, é aquela velha máxima de não se fazer omelete sem quebrar os ovos. E ainda tem que ter frigideira, sal a gosto e manteiga. E lavar a louça depois. Desculpe desapontá-lo, amigo, mas não existe almoço grátis nesta vida.
Pense nisso antes de reclamar de tudo ou de invejar o outro. Antes de dizer que nada dá certo, que você não tem oportunidade, que é um pobre coitado. Pare de se enganar, tome decisões e trabalhe por elas, dias, noites, semanas. Levarás alguns nãos, cobiçarás a sorte alheia, temerás o inesperado, terás dias difíceis e noites insones, sofrerás e pensarás em desistir. Mas seu dia chegará. E aí todo o esforço terá um sentido.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Do que eu sei do matrimônio

Dizem que é instituição falida, eu digo que está em franca recuperação. Dizem que desgasta a relação, eu digo que une o casal. Dizem que é o fim da vida, eu diria que é o recomeço. Mas precisa regar a plantinha. Tem que ter amor.
Casamento não é para iniciantes, é para quem já conhece um pouco de si, do outro, e da vida. Não serve como estopim para sair de casa, nem como grito de liberdade. Mas tem suas serventias.
Casamento é bom para quem sabe dividir, e para quem gosta de conversar, e de ouvir. É curso completo de paciência, e um ensaio sempre inacabado do que poderia ser e não foi. É vinho argentino em plena quarta-feira, e um roteiro delicioso de pequenas rotinas. Casamento é ouvir a tevê cospir tiros ou gritos de gol nas tardes de domingo e filmes românticos nas noites de sábado. É não se constranger em partilhar silêncios nem se impressionar com inesperados sorrisos. É brigar por palavras mal entendidas e por outras que nunca foram ditas. É sofrer por dar sem receber ou por receber aquilo que não se quer dar. Casamento é uma tentativa autodidata de aprendizado do idioma do outro. Mas pode ser também puro medo da solidão. É visitar lugares que você nunca iria se fosse outro o seu estado civil. É assinar junto tudo que for importante, e separado os bilhetinhos de amor. É mistura de doce com salgado, azedo com amargo sem dar indigestão. Casamento é cuidar do outro como se cuida de si mesmo.

terça-feira, 12 de junho de 2012

O ET

Prazer, sou um ET, vim de outro planeta, de uma galáxia muito, muito distante. Não tenho super poderes, não sei voar, não leio mentes, mas você vai ver, sou diferente, muito diferente.
Dou bom dia diariamente às pessoas que vejo, com um sorriso no rosto. Espero minha vez de falar, não interrompo os outros. Se recebo o troco a maior na saída do restaurante, não me aproveito da distração de quem me paga, aviso sem hesitar e devolvo o que não me pertence. Respeito sinal amarelo, e não buzino assim que ele vira para o verde. Tenho poderes mágicos: sei esperar minha vez sem reclamar. Não invento que sou estudante para conseguir desconto no cinema, nem mesmo no show da Madonna, a minha diva loira. Contenho-me quando me xingam no trânsito ou quando os apressadinhos da vez passam na minha frente na bilheteria do shopping. Sou cavalheiro, abro a porta do carro para as mulheres, e carrego suas sacolas no metrô. E, sim, pasmem, mas eu aperto o botão vermelho da alfândega quando trago mais de quinhentos dólares em compras do exterior.  
Eu existo, acredite. Mas sou ET de espécie rara, em extinção. Poucos iguais a mim ainda sobrevivem espalhados pelo planeta. Peço, por favor, ajudem a preservar minha raça, cultivem minha espécie! Não nos deixe morrer!

terça-feira, 5 de junho de 2012

Carta para a mulher moderna

Descobri, ou melhor, fui descoberta, num longínquo aniversário, por um presente incrível que recentemente reabri para meu deleite: um livro hilário e delicioso da Clarice Lispector em que foram reunidas todas as dicas escritas por ela, por um pseudônimo, no Jornal “Correio da Manhã” na década de 60. Dicas aparentemente fúteis, mas de uma importância ímpar. Lembram, à mulher feminista, pós-moderna, centralizadora de tantas tarefas, do quanto ela está se afastando da sua essência, e daquilo que os homens mais buscam nelas: a feminilidade. Tema atual, não? Não por acaso, resolvi voltar a ele e bebendo das palavras de Clarice sugerir, humildemente, uma provocação. Chama-se “carta para a mulher moderna”.

Mulher, presta atenção! Você presta contas para tanta gente, e para sua auto estima? Você tem ligado para ela? Tem chamado-a para um vinho no final do expediente, dado um agradinho no final de semana? Ou manda a pobre as favas, ela que só quer um pouco de carinho e atenção? Não admito, trate de se cuidar! Chega de andar pela casa com aquela camiseta esfolada e russa de quando você tinha 15 anos, o que o seu marido vai achar disso? Que tem coisa mais interessante por aí, certamente...Pare de pensar só na manicure e na tinta do cabelo, isso é elementar. Use seu charme, use maquiagem, use suas armas. Compre uma lingerie nova, insinuante e que não seja cor de pele, por favor. Disfarce as celulites num vestido que lhe caia bem, e não que aperte até sua alma. Invista num vestidinho preto de qualidade, e em um bom corretivo, que lhe salvam de qualquer cilada. Não pense que ser atraente é tascar qualquer cobre pele de tecido sintético na versão periguete sênior animal print. Menos! A malha e o algodão são mais recomendados, são esvoaçantes, e não deixam cheiro em caso de um suorzinho inesperado. Cuide do seu sorriso, dos seus dentes, não gaste todo seu dinheiro com escova progressiva e tintura amarelo ovo, aliás, fuja de coloração que não combine com seu tom de pele. Fale baixo, seja suave, e sorria ao invés de gargalhar sonoramente por qualquer coisa. Reclame menos, e coma menos também, mas não economize na cortesia, educação é o melhor de todos os charmes. Enfim, cuide-se para você mesma, antes de cuidar-se para os outros. E não me venha com aquele papo xarope de diminuir a idade. Agora vá, e não perca mais sua auto-estima de vista.  

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Nome aos bois

Vivemos a era da verborragia exaltada, dos excessos de exclamações, das exasperações inúteis e recorrentes. As palavras foram rebatizadas e ganharam novo sentido: urgência virou chiclete na boca daqueles mimados que precisam ser atendidos na hora que querem, pelo motivo que for. Urgência pode ser usada tanto pelo seu namorado que não admite ser atendido pela caixa postal do seu celular, quanto pelo seu cliente que acha que tem prioridade em falar contigo. Aliás, prioridade é a tendência outono-inverno e primavera-verão: sempre em voga! Prioridade transformou-se em sinônimo do antigo “sabe com quem está falando?” ou, em bom português “ tirem essas pessoas da minha frente que mereço ser atendido primeiro, especial que sou”.
E ainda tem aqueles que acham que depressão é qualquer “não” que se toma, dos tantos que existem nesta vida. Se contrariados ou confrontados, caem doentes e se automedicam com qualquer antidepressivo, dizendo-se em crise. E ai de quem não mostrar cara de preocupação. Aff!
A genialidade e a coragem renasceram sob a alcunha de “maluquice”,  vocábulo frequentemente mal empregado, usado para tudo que não seja convencional aos olhos da maioria. E seguem tantos outros pela desordem alfabética do nosso dicionário de uso pessoal.
Mas atenção: a cura para o mal é de fácil tratamento: voltar aos bancos escolares ou visitar, vez ou outra, o Seu Aurélio, para entender, de vez, o real sentido das palavras. E para o arremate: deixar de dramatizar qualquer probleminha rotineiro, dando os nomes – certos – aos bois que aparecerão pelo caminho.

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Desapegue-se!

Não sou do tipo. Daquele tipo maníaca por arrumação. Blusas distribuídas por cores, no estilo degradê. Sapatos enfileirados em ordem, mantimentos agrupados milimetricamente. Gosto de ordem, mas prefiro progresso, e às vezes, para seguir em frente, é preciso deixar um pouquinho de lado o excesso de método e priorizar o que realmente interessa. O conteúdo no lugar da forma. Praticar o desapego, em bom português.
Outro dia estava vivendo uma situação de emergência, precisava sair de casa com rapidez, e me vi escrava de um ritual simples e inútil, que costumo fazer sempre que acordo: aquela ordem cíclica e invariável em que acordamos, escovamos os dentes, tomamos banho, nos vestimos e por aí vai. Estava com pressa, poderia ter queimado algumas etapas do processo que não faria diferença alguma, eu simplesmente ganharia dez minutos se deixasse de me ensaboar duas vezes, a primeira de baixo para cima e a segunda de cima para baixo. Como eu não estava vindo de uma temporada em alguma área distante do planeta com escassez de recursos hídricos ou em guerra civil com racionamento de água, o meu banho não exigiria esforços hercúleos de limpeza, e bastaria uma simples chuveirada para que eu estivesse pronta para outra guerra: aquela diária, para ganhar o pão. Mas, que nada, meu inconsciente simplesmente não me deixou perceber a inutilidade de tudo aquilo. E lá fui eu tal como uma soldada enviada numa missão secreta: não podia falhar!
Será que preciso me tratar? Que sou mais uma vítima do TOC, o mal do século? É mais fácil pensar assim, terceirizar a culpa, mas vejo que quem precisa de um toque somos todos nós que nos conformamos com a zona de conforto do que nos é familiar. Mudar, para quê? Como se mudança fosse algo negativo, sujo, vergonhoso. Quando a mudança que é sinal de coragem, de crescimento, de ousadia.
É um exemplo simples, o que dei acima, mas que demonstra claramente o quanto nos escondemos naquilo que conhecemos com medo do novo, ainda que estejamos numa posição que quase nos empurra em outra direção. Veja: eu estava atrasada, com pressa, mas fiquei angustiada apenas em enfrentar a possibilidade de desobedecer a sequência com a qual me acostumei. Imagine isso em perspectiva macro? Assustador, não? Também acho. Tratemos, então, com igual urgência, de nos desacostumar, de nos desmistificar, de nos modificar. Mudar o caminho, os hábitos, os rituais, os rumos. Ficar igual para sempre é morrer um pouco a cada dia, e o grande barato nesta vida é nos reinventar, senão, tem jeito, não, a onda te leva e você nem percebe que ficou para trás.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Palavras Cruzadas

    Se penso, tento, se tento, falo, se falo, vento
Se vivo, quero, se quero, luto, se luto, venço
Se amo, penso, se penso, calo, se calo, tempo

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Mães em Fúria

Faço parte de um grupo de discussão virtual formado por mães jovens, em sua maioria, mães de primeira viagem, como eu. O grupo é de discussão mesmo, não só metaforicamente. Tudo vira polêmica, desde a opção de parto normal x cesariana até filhos que dormem sozinhos ou com os pais, passando por uma infinidade de outros assuntos do mesmo relevo “mulherzinha”.
Não era novidade para mim que as mulheres gostam - e como gostam- de um bate boca, e que ficam com a boiada alimentando no pasto esperando só o sinal verde para entrar numa briga (ou seria para não sair dela?), mas mesmo assim me pego impressionada com a capacidade que nós temos de precisar convencer o outro de nossas verdades quando, aparentemente, estamos precisando é convencer a nós mesmas.
Eu já estive no ringue algumas vezes, bati, apanhei, mas no final, surpresa!, ninguém vence, acabam todas empatadas. Sim, porque não há como empacotar uma realidade que funciona para você e vender para os outros, ou sentir-se mais valorizada porque o seu modelo familiar é aquele indicado pelos especialistas. Na sua vida, baby, a especialista é você.  E viver de comparações é viver infeliz, porque sempre haverá aquela que engordou menos de 10 quilos na gravidez (sim, isso existe!), ou que perdeu 10 quilos em um mês depois do parto, ou que consegue educar três filhos trabalhando doze horas por dia. Há exemplos para todos os gostos e tamanhos, mas, como tudo nesta vida, nem todos se adaptam a nós.
O que percebo é que aquelas que ainda estão inseguras de suas escolhas pessoais são as que vestem a armadura e empunham a espada para suas adversárias com mais agressividade. A luta é contra elas mesmas, mas elas ainda não se deram conta disso. A verborragia é usada como um meio de autoconvencimento. Se funciona? Vai saber.
Há mulheres que ainda hoje vivem bem na função de mãe em tempo integral e outras, como eu, que precisam do seu ofício como do ar que respiram, e que são mães mais felizes porque são profissionais realizadas. A qualidade do tempo ao lado dos filhos nada tem a ver com a quantidade repetem as terapeutas de família. Em outras palavras: pelo tempo que der, esteja inteira e feliz, senão é um corpo presente com alma ausente, ou seja, não vale nada.
Toda discussão passional com terceiros sobre como se deve criar nossos pintinhos é uma perda de tempo danada, cada mãe é una e suas escolhas levam em consideração o universo que gravita em volta dela. Babá ou creche, dormir junto ou separado, parto normal ou cesária, filho único ou dois filhos, mães que trabalham ou mães full time, escolha o tema que quiser. Qualquer deles só merece uma escolha: aquela que você e o pai do seu filho fizerem como a mais adequada .
Mas eu sigo insistindo em assistir o vale-tudo que tem se tornado esse grupo mesmo sabendo que farpas podem acabar me atingindo de raspão. É que, sabe como é, mulher adora assistir a uma confusão de camarote. Perda de tempo, eu sei, mas diversão garantida...

terça-feira, 17 de abril de 2012

Quem vai me salvar de mim mesma?

A quem destino meus enigmas?
Despeje-os na folha em branco, ouço de um lado, exorcize-os, me sopram de outro. Dois caminhos sempre apontam e não posso me dividir. Preciso decidir. A cada instante, por longos segundos, a todo momento.
Persigo o equilíbrio, mas a corda é bamba e sempre pende para uma direção. Se estou no comando, saboreio a vitória, mas logo a tentação se aproxima e caio de novo. As vezes um mero deslize, outras um tombo e fratura.
Não sei se estou salva ou se estou perdida, ou, quiçá, ambas as coisas.
Quando reúno forças e sigo em frente, poucos metros depois a dúvida me alcança novamente. Estava certa, agora, não mais. E como faz?
Se na certeza tenho receio e na dúvida tenho medo? Não tem segredo, a estrada é longa e o caminho árido e solitário. Não há como nos libertarmos neste vôo cego.
A bifurcação nos acena no horizonte, e vem se aproximando. Demovê-la ou enfrentá-la? Decida. E sem levar peso extra. Largue sua mochila de dúvidas. E dobre em direção ao seu destino. Pronto. Não olhe mais para trás.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Geração Barbie

Já reparou a sua volta? A modernidade deixa tudo igual. Eu, você, todas nós. Vestimos as mesmas roupas, suspiramos pelas mesmas grifes. Os sapatos da moda, os vestidos de Hollywood. O padrão de beleza universal da magra com curvas, a pele alva sem rugas, o cabelo liso levemente ondulado. Todas querem ser Gisele. As que não têm peito, compram alguns mililitros, as que têm muito, vendem alguns litros. Todas na fila da aula de spinning com suas bolsas francesas de duas siglas guardadas no locker da academia. Um exército de Flávias, Luisas, Fernandas, cinderelas que aspiram uma carreira bem sucedida, um casamento cinematográfico, o apartamento mobiliado pelo arquiteto da moda, o casal de filhos de capa de revista.
Quando juntas, se confudem, se misturam, tropeçam sobre as palavras. Todas sob a mesma voz. O criador se fundiu com a criatura? A geração das mulheres-Barbies, cinturinha pilão, roupas deslumbrantes, cabelão platinado, invejando os acessórios das amigas: salão de beleza, carro conversível, restaurante cinco estrelas, viagem para Paris.
Se autenticidade é artigo fora de catálogo, fato é que essa geração produz mulheres pré-fabricadas, em série, que não se contém em profanar as hereges que não foram aprovadas pelo controle de qualidade selado na maioria. Oremos por elas, coitadas, que desistiram de viver alisando o cabelo ou de morrerem de fome para caber no opressor manequim 38.
Felizes são as outras, isso sim!
A história se repete, e o que se vê é nova roupagem para o velho e perene desafio de lidar com as diferenças, de superar a dificuldade do respeito sem o julgamento a reboque. Vamos nos despir da beca e do martelo, meninas, ficaremos muito mais leves, tenho certeza. Precisamos urgente desta dieta  até para nos libertarmos das algozes que fomos de nós mesmas. Experimente mais essa: trocar de lugar com o outro! Nem água e alface emagrecem tanto a alma, é exercício tão recomendado como caminhar todas as manhãs.
Tarefa espinhosa essa que propus, einh? Reconheço, e ainda exige cuidado constante, atenção redobrada para não perdermos o hábito. Mas, pelos poderes de Greiscow!, faça o esforço. Eu estou na lida, é minha utopia de mulher pos-moderna analisada, e um dia chego lá.
Sorte mesmo tinha Leila Diniz. Fazia o que lhe dava na veneta e virou cult.


Cinco minutos

Não quero jóias, nem preciso de mais sapatos. Não me venha com presentes de fim de semana. O que quero não tem para vender. É luxo para poucos.
Preciso de tempo, mesmo que em doses homeopáticas, aprisionadas em frasquinhos de poucas gramas. Dê-me mais cinco minutos e serei feliz que nem criança.
Cinco minutos não é muito, mas serve, atende o que desejo. Cinco minutos para prolongar meu sono, para aninhar minha filha nos meus braços e embalá-la. Cinco minutos para abraçar longamente meu marido e repousar em silêncio no seu ombro. Cinco minutos para que eu deixe a pressa em casa e saia sozinha, livre, sem sua sombra sempre ao meu lado me perseguindo. Cinco minutos para poder apreciar a música que está tocando no rádio, sem cometer a heresia cotidiana de interrompê-la, logo ela que reacende lembranças tão doces. O tempo de saborear o gostinho do café na boca depois do almoço e o finzinho do bate papo com a amiga que não vejo há meses. Os contados minutos que desperdiçamos em filas, no trânsito, na espera burocrática e hodierna do tempo perdido que leva a lugar nenhum.
300 segundos. Tempo suficiente para ir até meus pensamentos e voltar à realidade. É isso que lhe peço: um gole de tempo, uma lufada de ar. Em outras palavras, dar um tempo do mundo.

terça-feira, 10 de abril de 2012

Férias de Mim

Preciso de uma indicação. De alguém que responda por mim. Por poucas horas. Vou ali e já volto.Quem pode ficar no meu lugar?    
A pessoa precisa ter poucas habilidades. Precisa ter paciência, para atender os clientes, e para lidar com os mais carentes. Precisa gostar de criança, mas não de qualquer criança. Daquela que faz birra quando é contrariada, que morde quando está com raiva, que não come nos finais de semana, que foge para a cama dos pais na madrugada, que arranha os seus cds preferidos e rabisca com esferográfica seu sofá de couro, que tu parcelaste por metade de sua vida profissional. O básico, sabe, nada demais.
Ah, e ainda tem que dá uma forcinha, vez ou outra, para os problemas jurídicos familiares, da irmã da tia da sua prima, que, pobre dela, precisa entrar com uma ação de danos morais até sexta feira porque sentiu-se estupidamente ofendida quando foi ao supermercado de bairro e eles não lhe garantiram sua prioridade absoluta, e deixaram passar na sua frente, logo ela, cidadã idosa!, um rapaz raquítico e mal educado que ainda lhe mandou um comentário debochado. E ainda por cima na frente de todo mundo, veja só!
E tem mais. A candidata também precisa encontrar o bombeiro que sumiu no mundo sem consertar o vazamento que insiste em pingar no banheiro da cozinha. E responder a uma média de uns 30 emails por dia, enquanto agenda uma consulta médica por telefone e organiza a pilha de documentos que enfeita a sua mesa de trabalho. Ah, e fui boazinha, viu, só deixei quatro prazos fatais para concluir até minha volta, coisa rápida, nada demais, você tira de letra, esperta que é.
Bem, acho que não esqueci de nada. Mas em caso de uma lembrança repentina, posso ligar no seu celular?
E aí, alguma interessada?

quinta-feira, 22 de março de 2012

Rosário

Recebi um convite honroso e inesperado. Como as boas coisas da vida. Amadrinhar, em consagração a Maria, é ser mãe de novo, e melhor, mãe sem bronca, sem noite em claro, mãe sem culpa. Fico com a parte mais gostosa, e não abro mão disso. Ter uma afilhadinha com nome de flor, com nome de música, com nome de cor. Pura poesia. Rosinha, hoje minhas palavras são suas!


Outro dia era botão de rosa. Hoje já desabrochou

Menina da pele alva, do cabelo escuro, menina flor

Cor do céu de outono ao entardecer

Rosa: que quero ver-te crescer

Que Deus lhe afaste dos espinhos e lhe cubra sempre de luz

Que ELE abençoe este dia, bendito dia, em que conheceu Jesus.

terça-feira, 20 de março de 2012

Faz me rir!

Hahaha. Morro de rir.O cara é assalariado, pendurado no cartão de crédito, mora com a sogra e faz malabarismos com o orçamento no final do mês. Você convida ele para jantar, ele vai com a esposa, todo pomposo, usa a blusa de grife que o cunhado trouxe de Miami e o perfume repassado pelo chefe que ganhou de presente no natal passado.
Você compra um vinho tinto argentino, bem recomendado, prepara um bom assado, encomenda uma sobremesa.
Ele apanha a garrafa, procura o país de origem, faz cara de intelectual para ler o rótulo e dá o diagnóstico depois do primeiro gole: frutado, aromas do Mediterrâneo, retrogosto de frutas vermelhas. E faz aquela pausa. A esposa, orgulhosa, enche o peito e dá um sorriso, olhando ao redor para mostrar a todos a sua expressão de primeira dama de Baco. Eu, incrédula com a cena, dou uma gargalhada. Mas que presepagem é essa? Virou sommelier? Eu que não me aguento! Eu que não seguro a língua dentro da boca!
Deixa eu explicar: adoro ser brasileira. Mas brasileiro tem dessas coisas, já falei aqui. Adora mostrar o que não sabe para parecer inteligente, para se enquadrar nos modismos de ocasião, para aparecer, diria minha mãe. Precisa fazer parte de uma tribo qualquer e andar por aí com o crachá pendurado no pescoço.
A onda agora é correr maratona, gostar de cerveja importada, entender de vinhos, conversar sobre arte moderna, viajar para Turquia. Tirando sempre muitas fotos para registrar para a posteridade, quer dizer, para a comunidade. Como somos cultos, ui!
Daqui a pouco a onda muda, e não se espante, vamos nadar para o outro lado. Basta que uma revista de domingo aponte as novas tendências que estaremos todos lá, na fila, esperando as novidades chegarem. Não importa, precisamos participar. E olha que eu também me incluo nisso, brasileira que sou .
Tudo bem, você diz, cada um gasta seu dinheiro e seu tempo como quiser, ninguém tem nada com isso. I know, baby, mas acho graça. E ainda com minha língua afiada e com meu dedinho nervoso, aí então que não me seguro!

sexta-feira, 16 de março de 2012

Admirável Mundo Novo

Outro dia assisti a uma entrevista de um americano famoso, mas desconhecido para mim, que me fez chorar e rir ao mesmo tempo. Ele dizia que o mundo é maravilhoso, mas as pessoas nunca estão felizes. Tive que concordar. Ele lembrou que fazia parte de uma geração em que os discos de telefone eram um desafio diário para a paciência. Quem tivesse mais de um zero no número era praticamente um lobo solitário porque para se acionar o zero era preciso virar o disco todo do telefone e isso dava um trabalhão danado. Era mais fácil esperar que o destino nos fizesse cruzar com aquela pessoa do que ligar para ela. Pensando aqui com meus botões: devia se gastar parte do dedo indicador ao longo da vida nesta tarefa.
Exageros a parte, hoje temos internet rápida, sem fio, telefones móveis que funcionam quase em qualquer lugar, e as pessoas ainda estão insatisfeitas. “De que adianta ter celular se não atende” ou “que droga, meu sinal não pega no metrô”. Quantas vezes eu mesma me peguei pensando assim! Mas vem cá, me diz, que raio de urgência é essa que não espera os poucos minutos que se gasta em atravessar quilômetros num trem subterrâneo de alta velocidade?
Uma outra cena comum, que você já deve ter presenciado, certamente. Pessoas incomodadas em deixar descansados seus aparelhos portáteis dentro das bolsas durante sessões de cinema, ou mesmo durante pousos de vôos. Mal se pisa o solo, e mesmo contrariando as recomendações técnicas, os passageiros não se agüentam e precisam verificar mensagens, checar emails, espiar a vida alheia nas redes sociais. Nos cinemas, que sempre foram refúgios de nós mesmos, o nosso eu virtual insiste em invadir o sagrado escurinho que agora reluz com os aparelhinhos indóceis de seus donos impacientes. E lá vamos nós de novo, afoitos por afagar nossos bichinhos de estimação, escravos desta tecnologia que acabou por nos subjugar totalmente.
Para aqueles que, como eu, viveram, mesmo que na tenra infância, a outra era, a era da vida real, ainda surpreende como fomos flechados pelos supérfluos tecnológicos. Aonde foi que nos perdemos, afinal. E qual é o sentido de tudo isso? Ganhar tempo? Ter ferramentas que facilitam nossa vida, nos aproximar de quem amamos? Ops, alguma coisa deu errada. “Houston, we have a problem”. Continuamos correndo, sem tempo, distantes, exaustos. O jeito é dar um boot e começar tudo de novo.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Confissões de uma balzaquiana

Devo confessar, ainda que engasgada com o sabor amargo do constrangimento que esta constatação  provoca: não nasci para ser rebelde. Sou uma ferrenha cumpridora de regras em tempo integral, uma trabalhadora braçal, de sol a sol, em ser certinha. Não espanta qual carreira eu tenha escolhido seguir. Meu boletim nunca trouxe anotações, não tenho pontos na carteira de motorista, sou mais fiel que um cachorro, minha ficha corrida é transparente de tão limpa. WTF? Você deve estar pensando. O problema é que ando farta de andar sempre na linha. Em 33 anos de vida meus maiores pecados foram tomar uns porres de vez em quando, sair da dieta, gastar um pouco além da conta (embora nunca tenha estourado meu limite de crédito) e, aimeudeus, nada mais. Nem cabular a aula! Nunca tomei multa, nunca bati o carro, nunca fugi de casa nem fiquei de castigo, nunca fumei o cachimbo da paz, nunca fui demitida. Nunca, nunca. Madre Teresa de Calcutá perderia o posto para mim. Como ainda não enlouqueci?
Pensando bem: tenho meus momentos de rebeldia, não sou santa, longe disso. Gasto toda esta energia reprimida de forma construtiva: faço exercícios, trabalho, cuido de filha, escrevo, leio, namoro, viajo, danço. Não é pouca coisa. Sempre foi assim, minha rebeldia adolescente era ouvir música aos berros trancada no quarto enquanto escrevia ferozmente numa máquina de escrever Olivetti, presente de natal dos meus 13 anos. Minha droga predileta, por sorte, era legalizada e vendida a poucos metros da minha casa: leite condensado misturado com Nescau ou qualquer outra coisa pastosa e doce, ok, também servia. Meu desafio maior era me tornar quem eu queria ser e para isso, vixe!,gasta-se uma energia danada.
A minha sorte é que sempre tive foco e nunca me deixei levar por modismos. Sabia, desde cedo, que os prazeres mundanos precisavam ficar sob controle, como um cão feroz, para não atacar seu próprio dono.
Explicação dada, obrigada, Freud. Mas ainda preciso fazer uma loucurazinha básica, sem efeitos colaterais, just for fun. Aceito sugestões, nada público, lembre-se de ser discreto como quem vos fala. Mande suas dicas inbox.

quinta-feira, 1 de março de 2012

As Maiores Invenções da Humanidade

A resposta pode até ser cretina, mas preciso perguntar. Para você qual é a melhor invenção da humanidade? Já mudei de respostas ao longo dos anos, mas resolvi listá-las e fazer um agradecimento público a esses soldados desconhecidos que venceram a incredulidade dos outros, as suas próprias dúvidas, a ignorância, até fincarem sua bandeira naquilo que criaram e que mudou nossas vidas.
1- Avião. A vida moderna seria inimaginável sem ele. Ganhamos tempo, segurança e porque não dizer, conforto. Imagino o que sofreram as moçoilas da Idade Média em seus pangarés franzinos que levavam dias para percorrer caminhos que hoje fazemos em minutos. Santos Dumont, i will always love you! Desde criança que adoro a sensação de levantar vôo e ir vendo os objetos diminuindo de tamanho pela janela do avião. Diversão garantida!
2 – Fraldas descartáveis – ok, ok, essa é uma escolha que só uma mãe faria. Saber que minhas recentes antepassadas, algumas ainda vivas, eram obrigadas a lavar e a passar fraldas de pano reutilizáveis sujas de cocô de papinha me dá arrepios. Eu realmente penso que antes da fralda descartável a mulher não poderia trabalhar simplesmente porque se o fizesse não seria humana. Somente a mulher maravilha daria conta da quantidade de fraldas de pano de uma família de três filhos, por exemplo, mais o trabalho em meio expediente. Sim, porque se trabalhasse mais que isso nem a heroína em quadrinhos daria conta.
3-Ar condicionado- Devo lembrar que esta lista é absolutamente pessoal. E não, eu não acho a internet ou o celular mais importantes. Eu moro num País Tropical, abençoado por Deus com temperaturas desérticas e sou obrigada a trabalhar em pleno verão carioca numa avenida em que - já testaram- se jogar um ovo, ele frita. E rápido. Entendeu agora?
4-Computador- talvez antigamente fosse fácil pensar na vida sem ele, e nem faz tanto tempo assim, lembro que eu mesma fazia meus trabalhos de escola buscando informações nas enciclopédias e os redigia em papel almaço. Alguém mais da época jurássica? Pois é, seja o original ou qualquer variação dele em telefone ou em aparelhos portáteis transformou a relação que temos com o mundo e encurtou distâncias.
E ainda tenho, em pensamento, inúmeros outros objetos incrivelmente importantes também: o papel, a caneta, o projetor de cinema, a vitrola e por aí vai. Essa é uma lista que não tem como ser enxuta. Well, sorte a nossa. Estamos rodeados por vida inteligente e quando menos se espera surge um novo coelho saindo da cartola. Que ele seja muito bemvindo.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Em verso e prosa

Me invada. Me liberte. Me abrace. Não deixe o vazio cair sobre nós.
Me enlace. Me sufoque. Me prometa: cale a rotina. Não quero ouvir a sua voz.
Envolva-me com suas asas, inebrie-me com sua graça. Cante para mim.
Esteja por perto, mas não se aproxime muito. Guarde-me perto do seu peito e se tranque junto.
Venha por inteiro, cuide de juntar seus pedaços pelo ninho. Entregue-se sem medo e voe alto comigo, meu passarinho.
Dispa-se do passado. Vista-se avistando onde quer chegar. E esteja sempre pronto para quando a felicidade pousar.
Descarregue suas dores, cubra suas feridas, permita-se. Traga somente aquilo que lhe sirva. E dê uma nova chance a vida.



terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Bloco do Eu Sozinho

Alô fevereiro seja parceiro: nos dê dias de sol, serpentina e pandeiro. Quero sair na avenida, desfilar meu sorriso pelas ruas do meu Rio de Janeiro. Ei, você aí, cadê meu abadá? Chegou a hora! “Simbora” no bloco “alegria com hora marcada”.
Peraí! Um momentinho: "silêncio, por favor".
Pausa para reflexão.
Ommmmm.
Retorno da reflexão.
Isso não é uma crônica, perdoem-me. É um desabafo. E um abraço naqueles que se sentem sozinhos, perdidos, atônitos assistindo a esta felicidade industrializada que se convencionou chamar de carnaval.
É festa profana para alguns, para mim são doses cavalares de tudo que afeta minha sensibilidade: barulho, calor, gente. Não temos como fugir, somos uma ilha de fantasias e para onde quer que olhemos a onipresença do batuque nos oprime porque nos obriga a participar desta festa. Mesmo que não confirmemos presença...
Viu só, não é só você...
Mas somos poucos, poucos que pensam que tudo em excesso nesta vida cansa e enjoa. Aliás, poucos que, simplesmente, pensam. A alegria de verdade talvez resida na ausência de questionamentos, na capacidade de divertir-se em qualquer ambiente sem racionalizar demais.
É claro que adoro estar com amigos, dançar e me divertir, brincar de ser um personagem, mas nem sempre esta vontade me atinge todos os anos, na mesma data. Às vezes gosto de carnaval no inverno, outras, quando chego em casa e vejo minha filha correndo ao meu encontro. Gosto de carnaval quando estou rodeada por quem amo e por quem me ama, ou quando sou positivamente surpreendida com uma peça do destino.
Mas recuso qualquer oferta embalada na obrigação social de felicidade, de esquecer quem eu sou só porque estou no meio da multidão enfurecida por alegria, ávida por preencher seu vazio existencial com bebida e música aos berros.
Sei não. Eu até posso dar meus pulinhos ensandecidos, mas felicidade para mim é outra coisa. E mora longe a beça deste frenesi ensurdecedor chamado carnaval.
Para os que ficam, boa festa. E não se esqueçam de levar engov, filtro solar, água mineral aos litros e bom senso. E vocês mesmos.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Lavar a Alma

Parabéns, você é uma pessoa de sorte! Acaba de ser premiada com a dica de um milhão de dólares: encontre um regador para a sua alma. Não sabe onde compra? Tá em falta no mercado? Serve um genérico: um chuveiro, uma cachoeira, um banho de chuva. Não importa, mas, por favor, prometa que  vai atrás de algo que lave a sua alma. Todos os dias, de preferência. Vá lá, duas ou três vezes por semana também serve.
Somos vítimas, indefesas, todo o tempo, do bombardeio dos anúncios midiáticos da religião do politicamente correto. Não coma sal! Combata os radicais livres! Faça exercícios físicos regularmente! Evite gordura hidrogenada! E ninguém lembra dela, coitada, a pobre da sua alma!
Lavar a alma é ter um amortecedor pessoal de estresse, um brinquedinho qualquer que libera a sua energia e lhe reconecta com o mundo. E em um mundo de escassez de recursos naturais se reabastecer de energia é a ordem do dia, caso contrário o corpo pifa e acaba precisando ser reanimado com energia química, industrializada, fabricada em laboratório e que precisa de receita médica. Quero não. Prefiro a endorfina, essa danada que muita gente só conhece de nome porque nunca se esforçou para conhecê-la pessoalmente.
Não é fácil manter a disciplina de lavar a alma. Nosso erro é colocar este item lá no final da nossa lista de prioridades. Agora já avisado, não caia mais nesta armadilha, nobre leitor! Procure, insista, experimente alguma coisa que lhe alivie. A vida só começa a ficar mais leve depois que você reconhece a vital necessidade de ser dar este mimo. Fique atento ao seu redor, muitas vezes a válvula de escape está ao seu alcance e é de graça: um banho de mar, um bom livro, o cinema do final de semana, um esporte, o chopinho depois do expediente... 
O mundo seria tão melhor se cada um cuidasse de regar sua alma. Os índices de violência cairiam, tenho certeza, e o consumo de antidepressivos também...
    Uma pessoa de alma lavada, dizem os especialistas, vive mais e melhor. Mesmo que contrarie todos os dogmas politicamente corretos. No mínimo, vale a aposta. Tenta, vai!   

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

"Nada Do Que é Humano Nos é Indiferente"

Ao contrário de muitas crianças, nunca sonhei em ser bombeiro. Não que eu me lembre, pelo menos. Queria ser escritora. Simples assim. Minhas aventuras eu escolhia de acordo com o gênero literário do momento. Gostava muito de mistérios, crimes a solucionar, acho que eu daria mesmo era uma boa detetive.
Mas nunca fiquei incólume ao lema dos bombeiros: Nada do que é humano me é indiferente. Tudo que é humano me atinge. E sou especialmente sensível a tragédias. A maior parte das pessoas se impressiona, mas, aos poucos, vai tocando a vida. Eu não. Eu fico acompanhando a rotina daquelas pessoas, e morro de vontade de dar um abraço em cada uma delas.
Recentemente um prédio desabou no centro comercial do Rio de Janeiro, e levou junto outros dois prédios, geminados. Era final de expediente, mas ainda havia muitas pessoas trabalhando. Naquele finalzinho de dia, consigo imaginar aquelas pessoas loucas para ir para casa, para abraçar os filhos, para beijar as esposas, para jantar, tomar um banho refrescante e dormir o sono dos justos. E de repente, quando esperavam concluir uma lauda de um relatório enfadonho, foram fatalmente surpreendidas com a morte, e com o que é ainda pior, com a morte súbita, inevitável, sem despedida.
Não consigo ficar indiferente ao tamanho deste sentimento suportado pelas famílias, da mistura incompreensível e indesejável da raiva com a dor da ausência, da saudade.
A tentativa de negar substituída pela tentativa de entender. O pensamento incessante do que ainda precisava ser feito, o sabor amargo das palavras que precisavam ser ditas. E a necessidade urgente de voltar a realidade, à rotina, enquanto o tempo parece parado, estático, desde a última vez que se viu a pessoa amada.
E no meio de tanta desolação, leio que pessoas foram flagradas remexendo nos escombros procurando objetos de valor ou equipamentos aproveitáveis e fico estarrecida. Como é possível que sejam imunes a tanto sofrimento? Como podem ficar alheias a dor, ainda maior, que provocam nessas famílias com este ato criminoso? Respiro fundo e deduzo: Se o lema dos bombeiros fosse válido para todos os seres humanos, eles não seriam os heróis que são.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Carta Aberta ao Meu Marido - Meu Manual de Instruções

Eu nunca disse que eu era fácil. Mas você quis ainda assim. E admito que isso é o que mais admiro.
Eu nunca enganei você. Sou angustiada por natureza, e meu codinome é “ansiedade”.
Não gosto de esperar, de escutar, de tentar. Gosto de fazer, de falar, de conseguir.
Não acordo de bom humor, e odeio casa bagunçada, você sabe. É mais forte que eu, aliás, nem combina comigo, mas são meus genes, maldita herança hereditária, “caspita”!
Se estou nervosa, faça como diz a música: simplesmente se afaste, e de preferência, quieto. Qualquer palavra poderá ser usada contra você.
Tenho propensão ao estresse, e num dia ruim, é difícil controlar a tempestade. Ao menor sinal de trovoada, recolha-se em lugar seguro e espere a chuva passar. Virá um raio de sol em seguida, pode esperar.
Sou reclamona e chata, e gosto de falar. Mistura explosiva, einh? Mas que mulher não é?
Tenho virtudes também, e por elas você já se apaixonou algumas vezes.
Gosto de uma ironia fina, e de uma gargalhada bem sonora. Faço você rir, até de si mesmo, algumas vezes.
A minha crueldade é açucarada, o máximo de mal que faço a humanidade é tecer meus comentários ácidos quando estou de TPM ou fazer uma ou duas cenas públicas que lhe constrangem algumas vezes e em outras lhe fazem não pagar a conta.
Não sou mulherzinha: não tenho frescura, não sinto frio toda vez que um ventinho do sul aparece, adoro um ar condicionado bem potente, e uma boa porcaria junkie. Que mulher quase igualaria seu recorde no rodízio de pizza? Aliás, bons tempos aqueles...
Sou solidária, tenho uma opinião sobre tudo, adoro gente e tenho riso fácil: é difícil não ser uma boa companhia vestindo esses predicados.
Peço desculpas quando erro. E não tenho medo de lhe mostrar todos os meus sentimentos.
Gosto de tudo que você gosta, sou uma boa parceira, sou sócia fundadora do “Hugo Futebol Clube”. Apoio este time até debaixo d´água. Mesmo ele que seja rebaixado para a quinta divisão.
Eu nunca disse que seria fácil. Mas nunca duvidei de quem eu queria ao meu lado durante o caminho. Sorte a sua, einh, parceiro?

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Epidemia Virtual

O que fazer? Fui picada pelo mosquito da internet. Não é um aedes aegypti, mas também pode ser letal. Previna-se. Faça sua parte. Veja se há, em sua vida, pneus velhos cheios de água em que este mosquito pode se reproduzir. Como identificá-los? Assinale as alternativas abaixo, cada uma valendo dez pontos. Se fizer mais de quarenta, siga para o parágrafo seguinte.
Você já está na Rede, (i) e tem um filhote de alguma geração dos aparelhos portáteis que começam com “i” que é a sua sombra (ii), e lhe acompanha a todos os lugares, quiçá ao banheiro ou quando está adormecendo (iii); você não postaria isso em seu perfil nem por um decreto, mas, no fundo, se preocupa demais com que os outros pensam (iv), precisa da aprovação alheia para suas decisões (v), ansiedade é seu segundo nome (vi), e comparação com os outros é que nem tique-nervoso (vii), você faz e nem percebe: sinto lhe informar: você já foi contaminada!
Sem perceber, você passa seus dias totalmente subjugada a qualquer objeto que navegue em sua rede social predileta, e diverte-se apontando, onde está, para onde vai, ou observando os outros amigos que fazem o mesmo. Você considera qualquer  pensamento vão um candidato a ser compartilhado publicamente, porque, afinal, faz parte da regra do jogo: dividir, dividir, dividir. As fotos, os pensamentos, os destinos, as viagens, os livros, as músicas, a vida. Trata-se da síndrome da globalização do privado ou seria da publicização do indivíduo? Apanhe o rótulo que quiser na prateleira e sirva-se a vontade! Mas, please, amiguinha, como tudo nesta vida, com moderação! E uma pitada caprichada de autocrítica.
Vamos ao curso de etiqueta virtual em cinco rápidas lições: Não precisamos saber que você acabou de entrar na padaria ou que se acha a mais gostosa do pedaço com sua foto tirada em cima do muro de casa se sentindo a gata da hora! Não me interessa, também, acompanhar sua opinião a respeito de TUDO que se passa na televisão e de TODOS os artistas que aparecem nela. E sejamos honestos: querer se enaltecer demais é uma chatice sem fim e coloca o candidato na fila dos inseguros de plantão, que precisam de reconhecimento público para tudo que fazem, quando, na verdade, precisam mesmo é encontrar um terapeuta para deixar de usar a internet como divã; E eu já ia me esquecendo: postar foto de você bêbado não dá a impressão do quanto você se divertiu, mas do quanto você precisa que os outros pensem que você realmente se divertiu.
O barato da coisa é compartilhar momentos, pessoas, lugares. Mas tantas outras coisas devemos continuar guardando onde sempre estiveram: na nossa lembrança. Usemos o bom senso porque como disse Greta Garbo: “Há muitas coisas em seu coração que você nunca deve contar a ninguém. Seria baratear o seu íntimo sair espalhando-as por aí.”

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

O que que eu faço com isso?

Você acorda com TPM. Faz um saque no caixa eletrônico e se vê no cheque especial. Segue para o trabalho. Primeira ligação do dia: o cliente foi grosseiro. Você engole o sapo a seco, sem nem um copo d´ água para ajudar. Chega em casa: sua filha está com uma virose e você passa a noite insone cuidando dela. Dia difícil, einh? Sua irritabilidade atinge a zona vermelha, disparando o alerta total: mantenha distância segura, não se aproxime. Cadê o seu passaporte para poder sumir no mundo?
Aí, inevitável, você cai aos prantos quando sua unha quebra e sua colega de sala começa a ladainha: fique tranqüila, não se aborreça com tão pouco, você anda muito estressada, tudo vai melhorar. Você agradece o carinho e as doces palavras, mas a raiva do mundo permanece. E o que você faz com isso?
Você está triste, sem rumo, querendo um colinho de mãe, mas a pilha de louça precisa ser lavada, e a pilha de trabalho na sua mesa precisa diminuir. A atendente de telemarketing liga para lhe oferecer uma promoção e você quer que ela vá para o espaço ao invés de tomar seu tão escasso tempo. Coitada da moça, estava só trabalhando, diz seu marido. Que se dane, quem mandou atravessar meu caminho logo hoje? Você respira fundo, tenta superar, sabe que está errada. As palavras de autoajuda não te consolam mais.  Que tal um rivotril? A angústia ainda não passou. E o que você faz com isso?
Tem dias que nada mesmo dá certo, e sua vontade é que um cataclisma se abata sobre a face da terra e remova todos os chatos, os grosseiros, os mal educados do mundo. Que sobrevivam somente seus amigos, seus ídolos, seus queridos. E nestes dias sempre aparece um leitor de autoajuda que lhe dá conselhos, lhe entope de frases feitas quando o que você mais precisa é de paz e silêncio. E de solidão.
Deixem-nos viver nossos dias de ira, de tristeza, de medo. Paremos de tentar analisar os outros o tempo inteiro, oferecendo ajuda, soluções, opiniões. Vamos viver nossas entressafras emocionais sem culpa, sem precisar justificar em duas laudas e com firma reconhecida a razão do que sentimos. Sentimos porque somos seres pensantes, sensíveis, sociáveis, ora bolas! E não porque estamos, necessariamente, com problemas. Mas só é possível separar um dia ruim de um problema grave se a dosimetria da dor puder ser medida sem lente de aumento. Moral da história: Fique atenta aos seus sentimentos, garota, e dispense, sem cerimônia, os intrometidos de plantão que andam se passando por psicólogo. E se precisar de uma forcinha, me liga, tá?

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Lição do Dia

Dia desses fui vítima de uma peça do destino tão comum, mas que ainda nos pega desprevenidos. Nunca estamos prontos para nos decepcionar com as pessoas.  O homem é o lobo do homem? Quanta amargura no coração, seu Hobbes! Isso eu pensei quando eu tinha 13 anos. Aliás, com 13 anos eu nem entendi a frase direito. Hoje vejo que ele estava quase certo. Estava mesmo era fulo da vida, devia ter acabado de descobrir que a mulher tinha lhe traído com seu melhor amigo. Não era o melhor momento de entrar para a história, você há de convir...
Sim, acontece, sim, você magoa, mas faz parte da vida. Parece um mero reducionismo, mas precisamos deles de vez em quando. Uma pílula ao dia, por favor. Se não, não dá para viver. Ser profundo nos faz mais sombrios e mais brilhantes, porém precisamos de mais simplicidade para não enlouquecer...
A história é a seguinte: Você conhece a pessoa. Ela se apresenta com todos os predicados, mostra-se animada, esconde os defeitos. Você tenta ser clara, dizer o que espera, acredita e aposta. E tudo segue caminhando direitinho até que um obstáculo aparece no caminho. A pessoa segue para o lado contrário ao seu. Como assim? Não estava tudo combinado? Leia atentamente as linhas de cima, caro leitor! Eu me esforcei, juro, fui clara, expliquei as regras, desenhei o que era permitido e o que era proibido! O que deu errado?
Nada deu errado, na verdade. As pessoas entram nas relações com expectativas diferentes, e guardam isso para si, na própria intimidade. Ninguém declara num primeiro encontro que espera casar com a outra pessoa, enquanto o outro está apenas contabilizando mais uma fêmea para sua lista de caçador, ou que espera encontrar uma pessoa legal para trabalhar ao seu lado, investir nela e vê-la crescer, enquanto a própria está pensando em ficar por ali até arrumar um outro emprego que lhe pague mais duzentos reais.
Vamos aprender de vez esta lição para não sermos reprovados nesta matéria: as relações, por mais duradoras que sejam não são eternas, e há de chegar uma hora que os interesses se dispersam e cada um segue na direção que escolheu, ou então a própria vida cuida disso, abreviando a linha do tempo. Nessas horas os sentimentos se misturam, mas precisamos ter maturidade para reconhecer que sentir raiva é inútil e sentir medo é inevitável, mas o mais apropriado é viver o luto do encerramento e depois esperar pelo novo que sempre chega. Sinto muito decepcioná-los, mas a vida não é uma revista de celebridades. Existe sim um lado negro da força que está sempre presente. Não é só contigo, meu amigo, todos vivemos dias difíceis, brigas em família, falta de dinheiro, quilos a mais na balança, decepções. Lição aprendida? Então “bora” para o próximo capítulo.