Estudar em um
colégio católico tem muitas utilidades. Noções de hierarquia e de disciplina são aprendidas quase com a mesma idade em que se aprende a andar e a falar. Desde
cedo também se conhece um conceito muito válido para religiões e regimes
políticos de pouca liberdade: o dogma. Longe de mim comparar as religiões
aos sistemas absolutistas, mas, academicamente poder-se-ia dizer, ao menos, que
bebem da mesma fonte. É a regra de poucas perguntas e muitos “amém”.
Não queira saber
o porquê, o dogma é o contrário daquilo que os psicólogos ensinam que não
devemos responder às crianças, é a ausência de motivação ou a ausência da
intenção em responder a verdade, também conhecido como “Porque sim” ou “Porque
não”.
Lembro-me que
curiosa que sempre fui, questionava porque o Papa era infalível. Não tanto por
não crer, mas mais por pura e infantil curiosidade, queria, na verdade, era saber
como se chegava a este estado onírico de estar acima do erro. Nunca me
responderam. Ou, ainda, por que razão não se podia casar e depois mudar de
idéia e se separar. Por que não, o que havia de tão sagrado neste voto que não
poderia ser desfeito? Se até os religiosos poderiam renunciar a batina.
Lembro-me ainda
não entender o que existia na santa eucaristia que fazia com que fosse, mesmo
depois de dois mil anos, parte do corpo de cristo. E isso sem dúvida me
atormentava porque determinadas perguntas eram quase ofensivas dentro de um
sistema educacional católico.
Não que eu acreditasse, aos 14 anos, que estaria
ingerindo um pedaço original do corpo de Cristo – o que certamente me faria
desistir da primeira comunhão- mas o que fazia com que aquele pedaço de
biscoito sem gosto como que por mágica divina o representasse? E nisso
consistia o tal do dogma, acreditar sem questionar, engolir sem mastigar.
Aceitar, mesmo sem compreender.
Creio que passados
longos anos, continuo professando minha fé, muito embora reconheça que para
mentes ávidas por respostas como a minha, o dogma vez ou outra represente um
obstáculo difícil de remover.
Entendo que a razão, per se, arruína qualquer
forma de fé, até mesmo a fé mais pura, sem tradicionalismos ou rótulos, que é
aquela fé em Deus, e não no ritualismo das religiões. Mas o homem é um ser
pensante por natureza e dizer a ele que para seguir uma religião deverá deixar
seu cérebro na geladeira é afastá-lo de sua essência, e, numa visão mais
ampliada, do próprio Deus.
Vejo com simpatia,
portanto, que os ventos estejam mudando na igreja Católica, e que um Papa
intelectual, mas essencialmente humano seja o comandante deste navio.
Ainda respondo
afirmativamente quando me perguntam se sou católica, sobretudo porque é a forma
mais conhecida e familiar que tenho de enxergar a Deus. Memórias afetivas de uma
vida de aprendizado em instituições religiosas me levaram a trilhar o caminho da verdade,
do autoesforço que aguarda recompensa, de temer o mal e aquilo que prejudique o
outro. Existem outros caminhos que levam ao mesmo destino, claro, mas este foi o
que conheci.
A despeito de tudo que vemos, hoje, na mídia, existem facetas iluminadas do catolicismo, tantas que amarga
saber que recentemente só se divulgue aquela do mal, da exploração sexual
criminosa de crianças, da corrupção por debaixo da batina.
Guardo comigo
recordações várias de professores religiosos que estimulavam a vida em
comunidade, a atividade pastoral e a ajuda ao próximo. E, como não lembrar, de outros
nem tão próximos da liturgia, mas que nos encorajavam a ser felizes, a ter uma
vida peregrina e a viajar o mundo e, de uma, em especial, que em uma aula de
religião confidenciou as meninas como reconhecer a sensação do orgasmo. Isso entre paredes de um colégio de padres,
altamente tradicional, no qual as alunas eram proibidas de usar vestes acima
do limite do joelho, sendo que a rebelde aqui que vos fala chegou a ser mandada de
volta para casa por um centímetro a mais de um recatado, porém nada sacro vestido floral.
Particularmente
acredito que a fé seja um anteparo para as vicissitudes da vida, o pão e o vinho
que nos conforta e, como eles gostam de dizer, que regozija nosso árduo caminho.
Parece ter mais sentido para mim um mundo que tenha uma figura paterna soberana,
porque toda forma de vida por nós conhecida nasce verdadeiramente de um outro
ser, de um pai.
São esses os valores que pretendo passar adiante, junto com meu DNA, para meus filhos, por isso espero, sinceramente, que o novo Santo Papa aponte, de forma infalível, os
caminhos para este rebanho de fiéis empoeirado , ávidos por uma transformação.