segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

"Nada Do Que é Humano Nos é Indiferente"

Ao contrário de muitas crianças, nunca sonhei em ser bombeiro. Não que eu me lembre, pelo menos. Queria ser escritora. Simples assim. Minhas aventuras eu escolhia de acordo com o gênero literário do momento. Gostava muito de mistérios, crimes a solucionar, acho que eu daria mesmo era uma boa detetive.
Mas nunca fiquei incólume ao lema dos bombeiros: Nada do que é humano me é indiferente. Tudo que é humano me atinge. E sou especialmente sensível a tragédias. A maior parte das pessoas se impressiona, mas, aos poucos, vai tocando a vida. Eu não. Eu fico acompanhando a rotina daquelas pessoas, e morro de vontade de dar um abraço em cada uma delas.
Recentemente um prédio desabou no centro comercial do Rio de Janeiro, e levou junto outros dois prédios, geminados. Era final de expediente, mas ainda havia muitas pessoas trabalhando. Naquele finalzinho de dia, consigo imaginar aquelas pessoas loucas para ir para casa, para abraçar os filhos, para beijar as esposas, para jantar, tomar um banho refrescante e dormir o sono dos justos. E de repente, quando esperavam concluir uma lauda de um relatório enfadonho, foram fatalmente surpreendidas com a morte, e com o que é ainda pior, com a morte súbita, inevitável, sem despedida.
Não consigo ficar indiferente ao tamanho deste sentimento suportado pelas famílias, da mistura incompreensível e indesejável da raiva com a dor da ausência, da saudade.
A tentativa de negar substituída pela tentativa de entender. O pensamento incessante do que ainda precisava ser feito, o sabor amargo das palavras que precisavam ser ditas. E a necessidade urgente de voltar a realidade, à rotina, enquanto o tempo parece parado, estático, desde a última vez que se viu a pessoa amada.
E no meio de tanta desolação, leio que pessoas foram flagradas remexendo nos escombros procurando objetos de valor ou equipamentos aproveitáveis e fico estarrecida. Como é possível que sejam imunes a tanto sofrimento? Como podem ficar alheias a dor, ainda maior, que provocam nessas famílias com este ato criminoso? Respiro fundo e deduzo: Se o lema dos bombeiros fosse válido para todos os seres humanos, eles não seriam os heróis que são.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Carta Aberta ao Meu Marido - Meu Manual de Instruções

Eu nunca disse que eu era fácil. Mas você quis ainda assim. E admito que isso é o que mais admiro.
Eu nunca enganei você. Sou angustiada por natureza, e meu codinome é “ansiedade”.
Não gosto de esperar, de escutar, de tentar. Gosto de fazer, de falar, de conseguir.
Não acordo de bom humor, e odeio casa bagunçada, você sabe. É mais forte que eu, aliás, nem combina comigo, mas são meus genes, maldita herança hereditária, “caspita”!
Se estou nervosa, faça como diz a música: simplesmente se afaste, e de preferência, quieto. Qualquer palavra poderá ser usada contra você.
Tenho propensão ao estresse, e num dia ruim, é difícil controlar a tempestade. Ao menor sinal de trovoada, recolha-se em lugar seguro e espere a chuva passar. Virá um raio de sol em seguida, pode esperar.
Sou reclamona e chata, e gosto de falar. Mistura explosiva, einh? Mas que mulher não é?
Tenho virtudes também, e por elas você já se apaixonou algumas vezes.
Gosto de uma ironia fina, e de uma gargalhada bem sonora. Faço você rir, até de si mesmo, algumas vezes.
A minha crueldade é açucarada, o máximo de mal que faço a humanidade é tecer meus comentários ácidos quando estou de TPM ou fazer uma ou duas cenas públicas que lhe constrangem algumas vezes e em outras lhe fazem não pagar a conta.
Não sou mulherzinha: não tenho frescura, não sinto frio toda vez que um ventinho do sul aparece, adoro um ar condicionado bem potente, e uma boa porcaria junkie. Que mulher quase igualaria seu recorde no rodízio de pizza? Aliás, bons tempos aqueles...
Sou solidária, tenho uma opinião sobre tudo, adoro gente e tenho riso fácil: é difícil não ser uma boa companhia vestindo esses predicados.
Peço desculpas quando erro. E não tenho medo de lhe mostrar todos os meus sentimentos.
Gosto de tudo que você gosta, sou uma boa parceira, sou sócia fundadora do “Hugo Futebol Clube”. Apoio este time até debaixo d´água. Mesmo ele que seja rebaixado para a quinta divisão.
Eu nunca disse que seria fácil. Mas nunca duvidei de quem eu queria ao meu lado durante o caminho. Sorte a sua, einh, parceiro?

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Epidemia Virtual

O que fazer? Fui picada pelo mosquito da internet. Não é um aedes aegypti, mas também pode ser letal. Previna-se. Faça sua parte. Veja se há, em sua vida, pneus velhos cheios de água em que este mosquito pode se reproduzir. Como identificá-los? Assinale as alternativas abaixo, cada uma valendo dez pontos. Se fizer mais de quarenta, siga para o parágrafo seguinte.
Você já está na Rede, (i) e tem um filhote de alguma geração dos aparelhos portáteis que começam com “i” que é a sua sombra (ii), e lhe acompanha a todos os lugares, quiçá ao banheiro ou quando está adormecendo (iii); você não postaria isso em seu perfil nem por um decreto, mas, no fundo, se preocupa demais com que os outros pensam (iv), precisa da aprovação alheia para suas decisões (v), ansiedade é seu segundo nome (vi), e comparação com os outros é que nem tique-nervoso (vii), você faz e nem percebe: sinto lhe informar: você já foi contaminada!
Sem perceber, você passa seus dias totalmente subjugada a qualquer objeto que navegue em sua rede social predileta, e diverte-se apontando, onde está, para onde vai, ou observando os outros amigos que fazem o mesmo. Você considera qualquer  pensamento vão um candidato a ser compartilhado publicamente, porque, afinal, faz parte da regra do jogo: dividir, dividir, dividir. As fotos, os pensamentos, os destinos, as viagens, os livros, as músicas, a vida. Trata-se da síndrome da globalização do privado ou seria da publicização do indivíduo? Apanhe o rótulo que quiser na prateleira e sirva-se a vontade! Mas, please, amiguinha, como tudo nesta vida, com moderação! E uma pitada caprichada de autocrítica.
Vamos ao curso de etiqueta virtual em cinco rápidas lições: Não precisamos saber que você acabou de entrar na padaria ou que se acha a mais gostosa do pedaço com sua foto tirada em cima do muro de casa se sentindo a gata da hora! Não me interessa, também, acompanhar sua opinião a respeito de TUDO que se passa na televisão e de TODOS os artistas que aparecem nela. E sejamos honestos: querer se enaltecer demais é uma chatice sem fim e coloca o candidato na fila dos inseguros de plantão, que precisam de reconhecimento público para tudo que fazem, quando, na verdade, precisam mesmo é encontrar um terapeuta para deixar de usar a internet como divã; E eu já ia me esquecendo: postar foto de você bêbado não dá a impressão do quanto você se divertiu, mas do quanto você precisa que os outros pensem que você realmente se divertiu.
O barato da coisa é compartilhar momentos, pessoas, lugares. Mas tantas outras coisas devemos continuar guardando onde sempre estiveram: na nossa lembrança. Usemos o bom senso porque como disse Greta Garbo: “Há muitas coisas em seu coração que você nunca deve contar a ninguém. Seria baratear o seu íntimo sair espalhando-as por aí.”

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

O que que eu faço com isso?

Você acorda com TPM. Faz um saque no caixa eletrônico e se vê no cheque especial. Segue para o trabalho. Primeira ligação do dia: o cliente foi grosseiro. Você engole o sapo a seco, sem nem um copo d´ água para ajudar. Chega em casa: sua filha está com uma virose e você passa a noite insone cuidando dela. Dia difícil, einh? Sua irritabilidade atinge a zona vermelha, disparando o alerta total: mantenha distância segura, não se aproxime. Cadê o seu passaporte para poder sumir no mundo?
Aí, inevitável, você cai aos prantos quando sua unha quebra e sua colega de sala começa a ladainha: fique tranqüila, não se aborreça com tão pouco, você anda muito estressada, tudo vai melhorar. Você agradece o carinho e as doces palavras, mas a raiva do mundo permanece. E o que você faz com isso?
Você está triste, sem rumo, querendo um colinho de mãe, mas a pilha de louça precisa ser lavada, e a pilha de trabalho na sua mesa precisa diminuir. A atendente de telemarketing liga para lhe oferecer uma promoção e você quer que ela vá para o espaço ao invés de tomar seu tão escasso tempo. Coitada da moça, estava só trabalhando, diz seu marido. Que se dane, quem mandou atravessar meu caminho logo hoje? Você respira fundo, tenta superar, sabe que está errada. As palavras de autoajuda não te consolam mais.  Que tal um rivotril? A angústia ainda não passou. E o que você faz com isso?
Tem dias que nada mesmo dá certo, e sua vontade é que um cataclisma se abata sobre a face da terra e remova todos os chatos, os grosseiros, os mal educados do mundo. Que sobrevivam somente seus amigos, seus ídolos, seus queridos. E nestes dias sempre aparece um leitor de autoajuda que lhe dá conselhos, lhe entope de frases feitas quando o que você mais precisa é de paz e silêncio. E de solidão.
Deixem-nos viver nossos dias de ira, de tristeza, de medo. Paremos de tentar analisar os outros o tempo inteiro, oferecendo ajuda, soluções, opiniões. Vamos viver nossas entressafras emocionais sem culpa, sem precisar justificar em duas laudas e com firma reconhecida a razão do que sentimos. Sentimos porque somos seres pensantes, sensíveis, sociáveis, ora bolas! E não porque estamos, necessariamente, com problemas. Mas só é possível separar um dia ruim de um problema grave se a dosimetria da dor puder ser medida sem lente de aumento. Moral da história: Fique atenta aos seus sentimentos, garota, e dispense, sem cerimônia, os intrometidos de plantão que andam se passando por psicólogo. E se precisar de uma forcinha, me liga, tá?

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Lição do Dia

Dia desses fui vítima de uma peça do destino tão comum, mas que ainda nos pega desprevenidos. Nunca estamos prontos para nos decepcionar com as pessoas.  O homem é o lobo do homem? Quanta amargura no coração, seu Hobbes! Isso eu pensei quando eu tinha 13 anos. Aliás, com 13 anos eu nem entendi a frase direito. Hoje vejo que ele estava quase certo. Estava mesmo era fulo da vida, devia ter acabado de descobrir que a mulher tinha lhe traído com seu melhor amigo. Não era o melhor momento de entrar para a história, você há de convir...
Sim, acontece, sim, você magoa, mas faz parte da vida. Parece um mero reducionismo, mas precisamos deles de vez em quando. Uma pílula ao dia, por favor. Se não, não dá para viver. Ser profundo nos faz mais sombrios e mais brilhantes, porém precisamos de mais simplicidade para não enlouquecer...
A história é a seguinte: Você conhece a pessoa. Ela se apresenta com todos os predicados, mostra-se animada, esconde os defeitos. Você tenta ser clara, dizer o que espera, acredita e aposta. E tudo segue caminhando direitinho até que um obstáculo aparece no caminho. A pessoa segue para o lado contrário ao seu. Como assim? Não estava tudo combinado? Leia atentamente as linhas de cima, caro leitor! Eu me esforcei, juro, fui clara, expliquei as regras, desenhei o que era permitido e o que era proibido! O que deu errado?
Nada deu errado, na verdade. As pessoas entram nas relações com expectativas diferentes, e guardam isso para si, na própria intimidade. Ninguém declara num primeiro encontro que espera casar com a outra pessoa, enquanto o outro está apenas contabilizando mais uma fêmea para sua lista de caçador, ou que espera encontrar uma pessoa legal para trabalhar ao seu lado, investir nela e vê-la crescer, enquanto a própria está pensando em ficar por ali até arrumar um outro emprego que lhe pague mais duzentos reais.
Vamos aprender de vez esta lição para não sermos reprovados nesta matéria: as relações, por mais duradoras que sejam não são eternas, e há de chegar uma hora que os interesses se dispersam e cada um segue na direção que escolheu, ou então a própria vida cuida disso, abreviando a linha do tempo. Nessas horas os sentimentos se misturam, mas precisamos ter maturidade para reconhecer que sentir raiva é inútil e sentir medo é inevitável, mas o mais apropriado é viver o luto do encerramento e depois esperar pelo novo que sempre chega. Sinto muito decepcioná-los, mas a vida não é uma revista de celebridades. Existe sim um lado negro da força que está sempre presente. Não é só contigo, meu amigo, todos vivemos dias difíceis, brigas em família, falta de dinheiro, quilos a mais na balança, decepções. Lição aprendida? Então “bora” para o próximo capítulo.