Tenho reparado
que a simpatia, que sempre foi o cartão postal do povo Brasileiro, ao menos por
aqui, nas minhas bandas é uma qualidade quase folclórica, longe a beça da
realidade.
Li recentemente,
mais instigada pela curiosidade do que pelo despeito, as razões que fizeram um
norte-americano odiar morar no Brasil, e concordo com grande parte de suas
observações, em especial aquela que diz que somos muito queridos com os
conhecidos, embora extremamente rudes com quem não faz parte do “cercadinho vip”
do nosso afeto. Há quem discorde por pura repulsa à inevitável carapuça, mas
que é verdade, isso é.
Eu chamaria de
síndrome da criança malcriada. Tal como quando chamamos a atenção ou
repreendemos uma criança, as pessoas, atualmente, quando criticadas, sobretudo
se flagradas fazendo algo errado publicamente reagem com uma selvageria
inacreditável, incapazes que são de suportar uma crítica de terceiros que
poderão colocar a perder a vaidade de um ego inflado. Ou inflamado de tanto
egocentrismo.
Não só os preços
do ramo imobiliário estão a alimentar uma bolha, os egos de nossos semelhantes
também crescem em proporções assustadoras. Não aceitam ser repreendidos, e
ponto final. Podem estar trafegando na contramão, ultrapassando pela pista da
direita, estacionando em cima da calçada que se sentem no direito de fazê-lo, e
ai de quem resolver questioná-los. Pena máxima para os advogados da lei, e não
para seus infratores. Pode isso?
E há, também, o
extremo oposto: quem, titular do direito, ao exercitá-lo, usar requintes de má
educação, como se a razão fosse um cheque em branco e assinado para que seu
portador reclame abusivamente, esquecendo-se dos princípios elementares de
convívio em sociedade.
Certo dia
protagonizei uma dessas cenas no metrô, e minha reação civilizada, quem diria,
é que provocou surpresa alheia. Nada como anos de terapia.
Diante do movimento de saída de uma pessoa que
estava a minha frente, sentada num dos bancos, enquanto eu estava em pé, me
mexi em direção ao assento que estava disponível, quando então a pessoa, de
maneira mais agressiva do que o necessário, me interpelou dizendo “estou
levantando para aquele senhor sentar, não você”.
Embora o assento
não fosse prioridade, me sensibilizei com a atitude generosa da moça, e, claro,
mantive-me na mesma posição, desculpando-me, já que não tinha como, de onde eu
estava, perceber a sua intenção. O curioso da situação é que o senhor não
aceitou a gentileza, e a moça ficou atônita com a atitude dele e a minha, já
que esperaria, em situações normais de temperatura e pressão, receber uma
resposta atrevida ou na mesma medida da sua. Calei-me depois do episódio e
permaneci de pé em frente a ela por mais algumas estações para seu desespero. O
desconforto era visível, ela sabia que não precisava ter sido ríspida, e meu
comportamento neutralizou totalmente o excesso do comportamento dela a ponto de
constrangê-la.
Penso que
precisamos de mais atitudes neutralizadoras como essa, caso contrário não
faltará muito para que esta panela de pressão nível máximo que coabitamos estourar de vez. E aí, salve-se quem puder.